Entrar na Taberna Rituana é como atravessar uma pequena brecha no tempo, onde a tradição e o sabor se abraçam num espaço modesto mas impregnado de alma. Situada na freguesia de Gulpilhares esta tasca discreta não grita por atenção — sussurra, convida com subtileza e recompensa quem lhe dá uma oportunidade com uma experiência gastronómica difícil de esquecer.
O espaço é pequeno, quase íntimo, como se tivesse sido pensado para refeições em voz baixa e trocas de olhares cúmplices. Ao todo, parece caberem no máximo vinte pessoas confortavelmente. A disposição é simples, sem excessos decorativos, mas com detalhes que contam histórias: o cheiro das madeiras antigas, a luz amarelada e reconfortante, e o leve som de vozes misturado com o aroma de comida feita com amor.
Apesar da escala reduzida, a Taberna Rituana serve pratos com uma generosidade que desmente o nome de “tapas”. O termo aqui é simbólico — cada prato chega à mesa como uma meia-dose disfarçada, suficiente para confortar sem saturar, para partilhar sem avareza.
Comecei pelos ovos rotos — uma verdadeira ode à simplicidade bem feita. Servidos da forma mais tradicional, vieram numa harmonia perfeita de texturas e sabores: as batatas, cortadas no ponto certo entre o rústico e o delicado, estavam envolvidas pelo sabor salgado e profundo do presunto, e tudo era unido pela cremosidade da gema ligeiramente escorrida. Um prato que, embora simples à vista, revela uma execução que exige tempo, sensibilidade e intuição.
Seguiu-se a "batata louca" — nome que já antecipa a ousadia do prato. Uma montanha reconfortante de batatas cobertas por uma camada generosa de queijo derretido, sobre a qual repousava um molho de francesinha que surpreendeu não pela força, mas pela elegância. Longe de ser agressivo, este molho era suave, aveludado e cheio de sabor, como se tivesse sido cozinhado lentamente, respeitando cada ingrediente.
Para sobremesa, pedi duas delícias caseiras: as célebres Natas do Céu, que fugiam da estética perfeita de pastelaria, mas ganhavam em autenticidade e sabor. A bolacha, em vez de se manter seca e separada, fundiu-se com o creme de ovos e as natas, criando uma textura quase mousse, intensa, mas leve ao paladar. Já a mousse de Oreo foi um verdadeiro fecho dourado: cremosa, doce no ponto exato, com o crocante subtil das bolachas equilibrado pela suavidade do creme — uma sobremesa que não cansa, mas sim conforta.
O atendimento é, sem exagero, exemplar. Familiar, atencioso, com aquele toque humano que hoje escasseia. Sente-se que estamos a ser recebidos numa casa, não num negócio. Os funcionários conhecem os pratos, recomendam com genuína paixão, e estão sempre atentos sem jamais serem invasivos.
A Taberna Rituana é um daqueles lugares que não precisam de artifícios para marcar presença. Comida honesta, sabor profundo, ambiente acolhedor e serviço que nos faz sentir parte da família. É o tipo de espaço que merece ser descoberto lentamente, saboreado com calma, e, acima de tudo, preservado.
Filipe Ferreira
.
26 Maio 2025
10,0