A carqueja, para além das suas propriedades medicinais, é muito utilizada na cozinha regional portuguesa, em especial para aromatizar carnes brancas de caça, mas também seus acompanhamentos. Daí que o “cartão de visita” desta Púcara seja um carolino de carqueja, servido a borbulhar em tacho de barro, enriquecido com pedaços de entrecosto e enchidos, todos em perfeita sintonia sob a refrescante batuta desta planta herbácea. Belo cartão de visita, diga-se, no contexto de um edifício amplo, com a robustez do granito e a sobriedade da madeira, pé direito alto, tornado moderno, confortável e atraente com a exigência dos novos tempos. E se as tábuas de queijos, enchidos, azeite e compotas regionais depressa desapareceram de entrada, a tiborna de bacalhau logo retomou o fio condutor do repasto, com o gadídeo em pequenas lascas envoltas em broa de milho, couve e salsa devidamente azeitadas, acolitadas por batatinhas a murro, e a fazer grande introito às carnes subsequentes. Tratado o arroz em epígrafe, em Britamontes não poderia faltar a vitela, longamente estufadinha no barro negro de Molelos, tenra, suculenta, e com a companhia assertiva de batatinhas coradas e grelos salteados, em mais uma plena satisfação do palato. Da extensa garrafeira, com legítimo destaque para a região vitivinícola do Dão, o “tinto da casa”, como gama de entrada, fez o seu papel com alguma discrição, mas o recomendado Vale Divino, Reserva Tinto, Dão, 2016, esse sim, revelou-se superlativo, com boa acidez, taninos macios e elegante complexidade, deliciando todos os comensais que souberam esperar para o acolher com merecidas honras. Grande blend regional! O serviço de sala, informal e informado, decorreu com boa disposição e eficiência e contribuiu, como se espera, para o prazer da refeição, que se prolongou, sem se dar conta, e que se guarda na memória, cognitiva e sensorial, com especial carinho e com o desejo de repetições vindouras.
João Carvalho
.
02 Maio 2025
8,0